A busca pelas causas subjacentes das doenças sempre foi um dos desafios mais intrigantes na genética humana. Com uma vastidão de possíveis mutações e dados experimentais limitados, identificar quais delas podem originar doenças permaneceu, até agora, um mistério. No entanto, uma nova ferramenta de Inteligência Artificial (IA) está prestes a lançar luz sobre essa questão crucial, oferecendo uma visão sem precedentes sobre as mutações ‘missense‘ e seu potencial impacto na saúde.
Mutação ‘Missense’ e sua relevância
As mutações ‘missense’ são aquelas que envolvem a substituição de uma única letra no DNA, resultando em um aminoácido diferente dentro de uma proteína. Para entender essa complexidade, podemos pensar no DNA como uma linguagem, onde a alteração de uma única letra pode mudar uma palavra, alterando, por sua vez, o significado de uma frase inteira. No contexto genético, uma substituição ‘missense’ altera o aminoácido que é traduzido, impactando diretamente na função da proteína.
AlphaMissense
Conheça o AlphaMissense, uma ferramenta de IA de última geração desenvolvida para classificar variantes ‘missense’. Este avanço notável é resultado do trabalho com o modelo AlphaFold, que previu estruturas de quase todas as proteínas conhecidas a partir de suas sequências de aminoácidos.
O impacto da IA na pesquisa genética
A IA tem o poder de acelerar a pesquisa em diversos campos, desde a biologia molecular até a genética clínica e estatística. Até então, os experimentos para identificar mutações causadoras de doenças eram dispendiosos e demorados. Cada proteína é única, exigindo a concepção de experimentos individuais, o que pode levar meses. Com a ajuda das previsões de IA, os pesquisadores agora podem obter uma prévia dos resultados para milhares de proteínas simultaneamente, permitindo a alocação eficiente de recursos e acelerando estudos mais complexos.
Compartilhando conhecimento
Todas as previsões geradas pelo AlphaMissense estão disponíveis gratuitamente para a comunidade científica. Além disso, o código do modelo AlphaMissense foi disponibilizado como software de código aberto, promovendo a colaboração e o desenvolvimento contínuo.
Compreendendo a importância
A classificação das variantes ‘missense’ é um passo fundamental para compreender quais dessas mudanças nas proteínas podem causar doenças. Até o momento, apenas 2% das mais de 4 milhões de variantes ‘missense’ observadas em humanos foram anotadas como patogênicas ou benignas por especialistas. Isso representa apenas 0,1% de todas as 71 milhões de possíveis variantes ‘missense’. As demais são consideradas ‘variantes de significado desconhecido’, devido à falta de dados experimentais ou clínicos sobre seu impacto. Com o AlphaMissense, agora temos a imagem mais clara até o momento, classificando 89% das variantes com base em um limiar que oferece 90% de precisão, utilizando um banco de dados de variantes de doenças conhecidas.
Metodologia
O AlphaMissense se baseia no modelo AlphaFold e foi treinado utilizando rótulos que distinguem as variantes observadas em populações humanas e primatas próximos. Variantes comuns são consideradas benignas, enquanto variantes nunca antes observadas são tratadas como patogênicas. O AlphaMissense não prevê a mudança na estrutura da proteína após a mutação, mas utiliza bancos de dados de sequências de proteínas relacionadas e contexto estrutural das variantes para produzir uma pontuação entre 0 e 1, classificando a probabilidade de uma variante ser patogênica. Essa pontuação contínua permite que os usuários escolham um limiar para classificar as variantes conforme suas necessidades de precisão.
Resultados significativos
O AlphaMissense atinge previsões de última geração em uma ampla variedade de benchmarks genéticos e experimentais, sem a necessidade de treinamento explícito com esses dados. Em comparação com outros métodos computacionais, o AlphaMissense se destacou ao classificar variantes do ClinVar, um arquivo público de dados sobre a relação entre variantes humanas e doenças. Além disso, o modelo mostrou ser o método mais preciso na previsão dos resultados laboratoriais, demonstrando consistência em diferentes abordagens de medição de patogenicidade.
Contribuindo para a comunidade científica
O AlphaMissense não é apenas uma ferramenta poderosa, mas também parte de um esforço maior para ampliar o entendimento global sobre as proteínas. Há um ano, foi lançado 200 milhões de estruturas de proteínas previstas usando o AlphaFold, beneficiando inúmeros cientistas ao redor do mundo e acelerando a pesquisa científica. Espera-se que o AlphaMissense também desempenhe um papel crucial na resolução de questões fundamentais na genômica e em toda a ciência biológica.
Colaboração para avançar a pesquisa
Uma etapa fundamental para transformar essa pesquisa em resultados práticos é a colaboração com a comunidade científica. A equipe está orgulhosa de ter trabalhado em parceria com a Genomics England para explorar como as previsões podem contribuir para o estudo da genética de doenças raras. Os resultados da Genomics England confirmaram a precisão e consistência das previsões do AlphaMissense, estabelecendo mais um marco real na aplicação desta nova ferramenta.